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novembro 14, 2016

NO PEQUENO MUSEU SENTIMENTAL
No pequeno museu sentimental

os fios de cabelos religados

por laços mínimos de fita

são tudo que 
dos montes hoje resta,

visitados por mim, montes de Vênus.

Apalpo, acaricio a flora negra,

e negra continua, nesse branco

total do tempo extinto

em que eu, pastor felante, apascentava

caracois perfumados, aneis negros,

cobrinhas passionais, junto do espelho
que com elas rimava, num clarão.

Os movimentos vivos no pretérito

enroscavam-se nos fios que me falam

de perdidos arquejos renascentes

em beijos que da boca deslizavam

para o abismo de flores e resinas.

Vou beijando a memória desses beijos.

Carlos Drummond de Andrade, em "O Amor Natural" Rio de Janeiro- Record, 1992.