Seguidores

29/04/2023

PEQUENA MORTE ( Luiza Nilo Nunes )

 Pairávamos acesos como pássaros à luz, era verão  

e adormecíamos no ventre das fogueiras  

– prometeicos utensílios que hasteavam sobre a noite  

a solidão da nossa escura juventude. 

 

Sobre as bocas arquejantes, sobre as nucas  

e os cabelos inflamados de pavor, 

 

sobre os versículos que inscrevíamos  

nos flancos prematuros,  

 

desvendávamos as facas da nudez 

e uma lâmina de sangue abria o sexo nas tábuas. 

 

Lembro agora: eram pungentes os perfumes, as grainhas  

do lamento, a adolescência que endossávamos  

 

ao voo dos pardais, quando em segredo,  

docemente desnudados nos estábulos de Agosto,  

 

pressentíamos o pássaro tombar nas cercanias,  

delicada pulsação de pombo fúnebre  

 

das núpcias. Lembro agora: a tua morte de rapaz 

nupcial, ardente mística da carne à flor da pele 

  

abrindo a flor e a raiz da minha carne,  

enquanto os mortos, ao redor, nas suas câmaras  

 

de sombra, como lírios que brilhassem 

pelos quartos obscuros 

  

vigiavam em silêncio, e descobriam-se,  

de súbito, vingados.