O espelho não me refletia
Mas as colheres prateadas me viam
Eu enxergava mais do que devia
Sabia que as paredes me assistiam
Meus braços percorriam o gesso poroso
Eu me deitava no chão gelado
E o teto me olhava choroso
Porque não podia sair dali
Ninguém entendia o que eu possuía
Apenas o ar que sussurrava em meu ouvido
Só que na hora da birra, nem ele me queria
São tantas coisas que poderiam ter sido
Mas não foram
As fantasias em que eu fugia
Fugiram de mim
E eu entendi que só poderia ser assim
Eu fui castigado em um cantinho da escada
E se eu não caísse, eu seria amado
Caso contrário, eu seria punido
E na minha boca, uma fita seria colocada
O mal estava feito
O espelho sem reflexo se quebrou
E pouco a pouco, no meu corpo se infiltrou
Agora sou aceito
Mas as colheres custam me ver
Sob meu corpo ferido se instalou saudade
Do que era para eu ser
Do que era a minha identidade