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fevereiro 14, 2017

UMA ARTE DA PAIXÃO
(Inês Lourenço)
Há uma espécie branca
De paixão, que nasce com
O poema, com o cuidado
Implacável de negar as palavras
À mudez do instante. Este cuidado
Está inscrito no sangue do poeta,
Na arte de acumular na pele
Dos sentidos, milhões de impulsos
Verbais, para que uma palavra
Enraíze e construa um verso
Que possa dar notícia do fremir
Imperceptível de uma ave, mesmo
Na rasura da penumbra, onde
Se pode inventar o rosto do amado,
A inclinar-se na janela do olhar
Encostado ao corpo da cidade
Que nos habita e vai ficar
Para além de nós, nessa descida
Até a margem de um rio
Onde só o poema
Consegue transgredir
As inexoráveis águas.

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