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01/06/2025

A SOLIDÃO ( Rita Santana )

 A solidão líquida dos tempos

Inunda-me de vastidões e incertezas.
Ouço o tremular do teu pensamento,
Homem de Outrora,
Quando, em desvios, encontra-me
Inoportuna e exata, diante de ti:
Já não quero nadas! Estou nua, livre,
Sem desejos e morta.
Já não sou aquela que juntos miramos.
Outra mulher vive meus dias.
Desabitei-me!

Extraviei ossos e sussurros.
Comi morangos frescos e aprendi o sabor das maçãs.
A cada dia, distancio-me da que fui,
Distancio-me de mim e das ilusões.

A rotunda fincada nas ruas
Dispersa a profusão dos nossos desenganos:
Perdemo-nos entre pampulhas, papoulas,
Catedrais e cátedras.

O azul penetra-me!
Já não feneço de amor,
Existo, e habito o fremir do horizonte.

Alinhavo cordilheiras em papiros
E os banho em pigmentos rubros.
Faço um varal de manuscritos
E grito teu nome em meus pesadelos.
Ainda deténs em mim a palavra primordial,
Ainda solfejo teu nome ao amanhecer.

Miríades de saudades explodem
Em meus abismos seculares.

Atravessa-me a Solidão do silêncio!
Maior que a solidão que atinge a pele,
É aspirar o sopro da solidão da Existência.
Existir é banir-se de si mesma e da humanidade
A fim de construir muralhas, pontes e mezaninos.
Existir é ser arquiteta de si mesma,
Refazer-se inteira com madeira de demolição.
Tornar-se Outra é testemunhar a ressurreição
Da carne.