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15/06/2025

ENFERMARIA ( Ana Paula Jardim )

 Aquela mulher ferida no tronco na enfermaria

Sentada
Braços caídos. Desistentes
Despida. Exposta
Seios flácidos
Sugados pela vida
Olhar fixo. Indiferente
Como uma escultura decadente
Que no fim do caminho somos só carne mastigada numa trituradora
Aquela mulher ferida no tronco na enfermaria
No meio de armários metálicos
Cheios de instrumentos para cortar a dor
Um cheiro intenso a éter a adormecer os sentidos
E muitas seringas em frascos
Desembaladas
Em nós
Aquela mulher ferida no tronco na enfermaria
De cabelos brancos
Desalinhados
Com o rosto e as entranhas enrugadas na pele
E as palavras todas recolhidas
Secas. Por dentro
Já não diz nada
Que no fim do caminho só resta o silêncio e o vocabulário fica gasto
Por baixo da língua
Aquela rapariga parada no meio da enfermaria
Como uma intrusa
Repentina. Imberbe. Franzina
Com uns olhos carimbados na testa
Foge por entre os corredores
Brancos. Desinfectados
Em direcção à luz
Na entrada.