A ti, poeta apátrida
Analfabeto
Que regurgitas versos épicos escritos nas entranhas
Como pedras
Que não leste em lado nenhum e te sobem pelo esófago
Como bílis ácida
E te deixam dobrado com uma dor aguda
A ti, artista que vês o mundo com olhos daltónicos
Perturbados
Em janelas cegas
Como um cativeiro
Com vidros confinados e sem cor
E pintas o cheiro dos pessegueiros das hortas em frente
Que crescem como fruta madura dentro da tua boca
E pincelas como tinta
A ti, condor de asas feridas no cimo das montanhas
Que foste derrubado em pleno voo
E ficas caído num silêncio majestoso
Nómada nos céus esquecido
Atropelado
A ti, mulher inteira e justa
Antígona traída
Andorinha emparedada num Inverno eterno
Sem bando nem destino a Sul
Sem Primavera
Eu vos invoco e canto
Seres de todos os desterros
Banidos
Ícaros queimados por todas as utopias
Derrotados
Sal das minhas lágrimas.